opinião
Os melhores amigos dos populistas são os incompetentes
Por Diogo de Oliveira Martins
Barreiro

Como ávido utilizador do Metropolitano de Lisboa, e jovem preocupado com o meio-ambiente e bem-estar da população das grandes cidades, entendo a necessidade de expandir tanto o Metro de Lisboa, como o seu homólogo no Porto. Alargar o Metro a mais pessoas, e torná-lo mais eficiente, permite reduzir o número de carros a circular, poupar dinheiro às famílias em transportes e permitir uma melhor coesão territorial. Não está, portanto, posta em causa a importância destas obras. Contudo, estas obras vieram acompanhadas de uma fatura muito amarga, mil e setecentos milhões de euros (1 700 000 000€), o dobro do custo da Ponte Vasco da Gama, um esforço necessário para obras de importância nacional.
O que causa, ou pelo menos deveria causar, espanto é como, com leviandade, vem o atual secretário de Estado da Mobilidade Urbana anunciar que o custo das expansões do Metro irá contemplar “um número final que se aproximará de 500 e 600 milhões de euros de custos adicionais”. Esta derrapagem no valor das obras corresponderá entre 29% e 35% do valor inicial da obra. É, sem sombra de dúvidas, uma grande derrapagem. E curiosamente, não se sabe ao certo se se ficará por aqui, porque à pergunta: “este valor pode ainda ser maior?”, o secretário de Estado responde: “Pode. Pode aumentar, naturalmente, como toda a obra pública que é feita (…) o valor final é sempre, por norma, ligeiramente superior.”. Naturalmente? Ligeiramente? A sério? Um aumento de 500 milhões de euros é um aumento ligeiro e natural? Um desvio aceitável no custo de uma obra deveria seguir os princípios das ciências experimentais, acima de 5% já é demais, errar em 30% é muito grave. Façamos um exercício mental para entender a imensidão desta derrapagem. Imaginemos um português médio que recebe 1400 euros por mês (assumir que são líquidos), este precisaria ter começado a juntar dinheiro há 30 000 anos, sem gastar 1 cêntimo, para que hoje fosse capaz de pagar esse desvio “ligeiro” e “natural”. O nosso português do exercício mental, nascido há 30 mil anos, não seria português certamente, e havia chances de ser neandertal.
Verdade seja dita, o governante não largou esta bomba orçamental sem apresentar uma desculpa e uma solução. Como justificativa para estes gastos adicionais, ficaram “custos de revisão de preços que resultam desta inflação excecional” e como solução, ou PRR paga ou o Fundo Ambiental ou então sairá do orçamento de Estado.
Todos os portugueses, até os mais distraídos, conhecem bem o impacto que a inflação está a ter nas suas carteiras. Os portugueses sentem-no quando vão aos supermercados, quando falta dinheiro ao final do mês e quando as faturas vêm mais pesadas do que o costume. A inflação afeta todos por igual (menos àqueles que faturam milhões com esta, como, entre outros, o Estado). Mas os portugueses sabem também, que uma derrapagem de 30% por causa da inflação é, no mínimo, invulgar. E sabem que este tipo de obras deveria ter um controlo permanente e mais apertado de modo a assegurar que qualquer aumento no preço final é justificado. O Primeiro-Ministro reconhece a necessidade de vigiar aumentos despropositados de preços, é por isso que este gastou um dia a ir a cadeias de supermercados, acompanhado pelos diretores das mesmas, ver se o nabo ou o melão tinham aumentado o preço depois do IVA 0%. Mas António Costa deveria ter largado a secção dos tomates e ter ido espreitar as empreitadas dos Metropolitanos, esses sim, tiveram um aumento expressivo.
É, portanto, claro que o governo falhou, e continua a falhar no acompanhamento desta matéria, estando à deriva no que toca à fatura final, mas sabe, contudo, quem vai pagar: os contribuintes. Os mesmos do costume. Uma espécie predominante em Portugal que, à vista dos nossos governantes, serve apenas para financiar o Estado. Caso a fatura seja paga pelo PRR, então dos contribuintes europeus se trata, mas os portugueses não ficam melhor, pois esse dinheiro que poderia ser investido noutras áreas, que tanto precisam, vai deixar de estar disponível. Se a fatura recair no Fundo Ambiental ou no Orçamento de Estado, então virá dos impostos dos contribuintes portugueses diretamente. De qualquer modo, é gritante o modo como este governo, e os dois anteriores, têm desbaratado o dinheiro dos contribuintes. Desde a compra e sucessivas injeções de dinheiro na TAP (ascendem os 3 mil milhões), à borla fiscal que se deu à EDP e à Engie de 300 milhões de euros, aos 240 milhões para a Efacec, esta governação tem sido pautada por comportamentos irresponsáveis do ponto de vista orçamental, ao mesmo tempo que “não há dinheiro” para outros setores da sociedade.
Será então aceitável do ponto de vista moral, desbaratar deste modo o dinheiro dos contribuintes, encher os cofres do Estado com as receitas vindas da inflação, receber rios de fundos da União Europeia que acabam por não ser aplicados, prometer uma redução sólida da dívida pública (para ser bem visto lá fora) enquanto os portugueses são obrigados a suportar custos associados à inflação, aumentos dos juros e uma carga fiscal asfixiante? Porque o que nos é dito é que não há dinheiro para repor o tempo de carreira dos professores, não há dinheiro para as escolas, não há dinheiro para aumentar salários e pensões, não há dinheiro para os médicos, bombeiros e polícias, mas pelos vistos há dinheiro para desbaratar.
Não me entendam mal, eu sou apologista de que o Estado tem de ter contas equilibradas, um déficit orçamental o mais reduzido possível (quem saiba um dia ter um superavit), uma dívida pública reduzida e ter programas que sejam sustentáveis do ponto de vista orçamental. Não há cá loucuras, sou conservador no que toca a gastar o dinheiro dos contribuintes. Contudo, tenho um lado social-democrata e sei que em tempos de aperto, os governos devem estar cá para prestar auxílio àqueles que mais necessitam, especialmente quando o Estado apresenta recordes de receitas. E quando o Estado não cumpre este seu papel, e desbarata o dinheiro que veio do árduo esforço dos contribuintes, estes sentem-se, no mínimo, defraudados e a desconfiança no Estado social tende a aumentar. E sem confiança, como é que podemos esperar que as pessoas se sintam confortáveis em entregar parte do seu ordenado a um Estado que lhes falha?
É deste descontentamento social que se alimentam os populistas. Estes veem nos revoltados combustível para as suas ideias e arranjam forma de os capitalizar para alavancar a sua popularidade. Prometem absurdidades, não apresentam contas, nem programas detalhados, rematam umas frases construídas para gerar controvérsia e cavalgam em preconceitos que podem nem ser verdade (mas a veracidade pouco lhes interessa). Mas, por mais atenção que a comunicação social lhes dê, ninguém é capaz de fazer as mais elementares perguntas, como “Como vai pagar tudo isso?”, “Como vai garantir a estabilidade orçamental?”, por vezes, mais que questionar as intenções, há que ter em conta os métodos. Contudo, os populistas fazem algo que os outros não são capazes, vendem esperança. E a população revoltada aceita-os, porque estes dizem-lhes o que querem ouvir. No processo, são banalizados discursos radicais, que apelam à queda do regime democrático, denominado por 3ª República, e vai crescendo o sentimento de que é preciso uma rutura mais profunda.
Conclui-se, portanto, que não são os que incompetentemente falharam em reformar o Estado e arejar a política nacional que são a arma de combate contra o populismo. E enquanto o medo e a revolta aumentam, exorta-se a que se deixe a inércia de reformar, exorta-se a que se deixe de desrespeitar o contribuinte e a deixar os mais desfavorecidos para trás, e no final implora-se que o povo acredite que é possível fazer diferente sem que se caia na teia do populismo. Para isso tem de se que respeitar o povo.
Diogo de Oliveira Martins
Estudante de Engenharia Aeroespacial
Barreirense e Social-Democrata
23.05.2023 - 11:06
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