opinião
ANOMALIAS E COINCIDÊNCIAS
Por Jorge Castanheira Barros
Setúbal
Poderão as Câmaras Municipais de Setúbal, Palmela e Sesimbra, apresentar uma queixa contra o Estado Português no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem por violação do Artigo 6º 1. Da Convenção Europeia dos Direitos do Homem pedindo a sua condenação com fundamento em intolerável morosidade processual.
O mesmo podendo fazer a Associação Movimento de Cidadãos pela Arrábida e Estuário do Sado.
A - ANOMALIAS
Têm sido muitas as anomalias verificadas nos processos judiciais relativos à co-incineração de resíduos perigosos em Portugal .
a) Uma das mais graves anomalias é a que resulta das contradições inerentes aos Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo ( STA ) de 31.10.2007 e 10.01.2008, proferidos respectivamente nos processos cautelares 471/07 ( relativo a Souselas ) e 675/07 ( relativo ao Outão ), que foram distribuídos, por sorteio, ao mesmo Juiz Relator Madeira dos Santos .
No Acórdão de 31.10.2007, proferido no proc. nr. 471/07 afirma-se que o despacho do Ministro do Ambiente, que dispensou a Cimpor da avaliação de impacte ambiental da co-incineração de resíduos perigosos em Souselas, « constitui uma causa remota ou longínqua dos prejuízos alegados pelo Município de Coimbra, cujo verdadeiro antecedente causal consistirá nos licenciamentos, caso eles venham a surgir na ordem jurídica », o que « exclui … a possibilidade de se suspender a eficácia do acto » .
No Acórdão de 10.01.2008, proferido no proc. 675/07, relativo à co-incineração de resíduos perigosos no Outão sustenta-se que a eficácia do despacho ministerial de dispensa da avaliação de impacte ambiental não poderia ser suspensa, visto se terem esgotado os seus efeitos com a atribuição das licenças, pelo que « o TAF de Almada – com o posterior beneplácito do TCA-Sul – suspendeu a eficácia de um acto já executado » .
Moral da história : a suspensão da co-incineração de resíduos perigosos em Souselas foi levantada pelo STA porque faltavam as licenças, no Outão por terem sido concedidas as licenças .
É preso por ter cão, preso por não ter .
b) Mas não se ficaram por aqui as anomalias ocorridas no STA nos processos da co-incineração de resíduos perigosos, pois que no Acórdão de 7.05.2009, proferido no recurso nr. 438/09 afirmou-se que « « não houve contra-alegações » , quando essas alegações de 30 páginas ( !!! ) apresentadas pelo Grupo de Cidadãos de Coimbra contra o recurso do Ministério do Ambiente e da Cimpor constavam efectivamente do processo , como acabou por ser reconhecido depois .
Conclusão nenhum dos 3 juízes que proferiu o Acórdão leu todo o processo .
c) A mais grave de todas as anomalias ocorreu no mesmo processo 438/09 relativo a Souselas quando através do Acórdão de 2.12.2009 os 3 juízes que o proferiram ( entre os quais de incluía também o já citado Juiz Madeira dos Santos ) resolveram imputar ao Tribunal Central Administrativo – Norte uma tese que este tribunal não defendeu, para assim poderem sustentar a tese contrária .
Confrontados com um Acórdão do TCA-Norte muitíssimo bem estruturado ( Acórdão de 12.02.2009 ) e não podendo legalmente alterar a matéria de facto já apurada os 3 juízes do STA ( que apenas julga sobre questões de direito e não de facto ) resolveram então inventar uma tese que não foi defendida por aquele tribunal de 2ª instância para assim poderem anular o inatacável Acórdão .
FOI POR MIM PROPOSTO À CÂMARA MUNICIPAL DE COIMBRA QUE MOVA UMA ACÇÃO DE INDEMNIZAÇÃO CONTRA OS 3 JUÍZES AUTORES DO ACÓRDÃO DO STA DE 2.12.2009 EXIGINDO COMO INDEMNIZAÇÃO 1 EURO POR HABITANTE DO CONCELHO DE COIMBRA POR CADA DIA EM QUE A CIMPOR ESTEJA AUTORIZADA A PROCEDER À CO-INCINERAÇÃO DE RESÍDUOS PERIGOSOS NO OUTÃO O QUE DÁ UMA INDEMNIZAÇÃO DIÁRIA DE 148.443 EUROS ( SEGUNDO O CENSO DE 2001 ) .
d) Mas as anomalias não aconteceram apenas no STA, pois também no Tribunal Central Administrativo - Sul os recursos nr.s 4.364/08, distribuído em 25.09.2008 e 5.221/09, que deu entrada no TCA-Sul em 9.06.2009 e que foram agora decididos em 1.07.2010 a favor do Ministério do Ambiente e da Secil estiveram retidos, durante quase 2 anos o primeiro e durante mais de um ano o segundo, numa altura em que estavam e estão em curso as operações de co-incineração no Outão e se pretendia obter através desses recursos a sua suspensão .
O art. 147º 2. do Código do Processo nos Tribunais Administrativos determina que o julgamento dos processos cautelares e todos os demais processos urgentes « tem lugar, com prioridade sobre os demais processos, na sessão imediata à conclusão do processo para decisão », o que significa que o 1º recurso devia ter sido decidido em Outubro de 2008 e o segundo recurso em Junho de 2009 .
PODERÃO AS CÂMARAS MUNICIPAIS DE SETÚBAL, PALMELA E SESIMBRA APRESENTAR UMA QUEIXA CONTRA O ESTADO PORTUGUÊS NO TRIBUNAL EUROPEU DOS DIREITOS DO HOMEM POR VIOLAÇÃO DO ARTIGO 6º 1. DA CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM PEDINDO A SUA CONDENAÇÃO COM FUNDAMENTO EM INTOLERÁVEL MOROSIDADE PROCESSUAL, O MESMO PODENDO FAZER A ASSOCIAÇÃO MOVIMENTO DE CIDADÃOS PELA ARRÁBIDA E ESTUÁRIO DO SADO DE QUE TAMBÉM SOU ADVOGADO.
É ISSO QUE JÁ RECOMENDEI QUE FIZESSEM PARA ALÉM DA APRESENTAÇÃO DE RECURSO PARA O SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO .
SE O ESTADO PORTUGUÊS FOR CONDENADO, COMO ESPERO, IREMOS EXIGIR QUE SEJA ACCIONADO O DIREITO DE REGRESSO CONTRA OS 3 JUÍZES QUE RETIVERAM ILEGALMENTE O RECURSO, EXIGINDO-LHES O PAGAMENTO DO MONTANTE QUE O ESTADO TIVER DESEMBOLSADO .
e) As anomalias aconteceram também na 1ª instância o que não é de admirar face aos exemplos que vêm de cima .
No Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada o mesmo Juiz que, por sentença de 23.01.2007 proferida no proc. nr. 994/06.2BEALM- A, considerou que « A lesão de bens jurídicos como os do ambiente e da saúde pública, a concretizar-se, assume frequentemente carácter irreversível, ou, pelo menos e atendendo à natureza dos bens em causa , de difícil reparação » e por isso determinou a suspensão da eficácia do despacho do Ministro do Ambiente que dispensou a Secil da Avaliação de Impacte Ambiental ( AIA ) para efeito da realização de operações de co-incineração de resíduos industriais perigosos na sua fábrica do Outão, veio um ano e meio depois recusar , por sentença de 30.07.2008, proferida no apenso B do mesmo processo a suspensão da eficácia das licenças ambiental, de instalação e de exploração concedidas à fábrica da Secil do Outão para a co-incineração de resíduos industriais perigosos, que têm o supra-referido despacho ministerial como conditio sine qua non .
Só porque houve dispensa de AIA pelo Ministro do Ambiente é que foram concedidas as 3 licenças acima indicadas .
O Juiz do TAF de Almada suspendeu o acto-causa, mas recusou a suspensão dos actos-consequência !!!
f) Por fim ( mas não finalmente, porque a procissão ainda vai no adro e estão 5 acções em curso na 1ª Instância, além dos 2 recursos que irão ser apresenatdos ao STA ) refira-se que um juiz do TAF de Coimbra resolveu seleccionar na sentença de 17.10.2008, proferida no proc. nr. 582/08.9BECBR, apenas os factos que eram favoráveis ao Ministério do Ambiente e Cimpor, omitindo os factos invocados pelo Grupo de Cidadãos de Coimbra que poderiam determinar a suspensão da co-incineração, situação que foi corrigida pelo Acórdão de 12.02.2009 do TCA-Norte , proferido no supra-referido processo, que ordenou a ampliação da matéria de facto com a integração de factos alegados pelos contestatários da co-incineração .
CONVENHAMOS QUE SÃO MUITAS ANOMALIAS E TODAS ELAS A FAVORECEREM O MINISTÉRIO DO AMBIENTE E AS CIMENTEIRAS DA CIMPOR E DA SECIL .
B- COINCIDÊNCIAS
Acresce que se verificaram nos processos em curso ou já julgados relativos à co-incineração de resíduos perigosos as seguintes coincidências :
Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada :
Foram distribuídas por sorteio ao mesmo Juiz todas as acções relativas à co-incineração de resíduos perigosos no Outão / Setúbal .
Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra :
Foram distribuídas por sorteio ao mesmo Juiz duas das três acções em curso relativas à co-incineração de resíduos perigosos em Souselas / Coimbra . A terceira acção foi aquela em que aconteceu a anomalia supra-indicada na alínea f) .
Tribunal Central Administrativo – Sul
Foram distribuídos por sorteio à mesma Juiz Relatora os dois recursos nr.s 4364/08 e 5221/09 relativos à co-incineração de resíduos perigosos no Outão e que agora foram decididos por Acórdãos de 1.07.2010 .
Supremo Tribunal Administrativo :
Foram distribuídos por sorteio ao mesmo Juiz Relator Madeira dos Santos os recursos nr.s 471/07 e 675/07-, respeitando a primeira acção cautelar à co-incineração de resíduos perigosos em Souselas e a segunda no Outão, tendo o mesmo Juiz sido Adjunto no processo nr. 438/09 ( relativo à co-incineração em Souselas ) .
Só chegaram até hoje ao STA 3 acções respeitantes à co-incineração de resíduos perigosos . Em todas elas teve intervenção o supra-indicado Juiz .
CONVENHAMOS QUE SÃO MUITAS COINCIDÊNCIAS
JORGE M . CASTANHEIRA BARROS
Coimbra, 14 de Julho de 2010
22.7.2010 - 2:03
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