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Barreiro - Projéctor «Infidelidades» de Woody Allen
Um laboratório para pensar a vida: o amor e a dor!
O Auditório do Teatro Projéctor, é um Teatro de Bolso, onde, notamos de sessão para sessão, que existe uma dedicação de melhorar o espaço e dar qualidade, quer para os actores, quer para os especadores. Melhoramentos que são realizados com dedicação e voluntariado.
O Projéctor está de parabéns e a cidade, sem dúvida, ganhou mais um espaço onde se faz cultura e arte.
Mais uma estreia com a sala cheia, com um público que viveu de forma intensa o espectáculo, com sorrisos e, até, boas gargalhadas, e, não faltaram os momentos de silêncio, a tocar os nervos, quando o drama nascia no palco.
No final a apoteose do público, de pé, a aplaudir aqueles que proporcionaram uma brilhante noite de teatro.
Entramos no Auditório. Sentamo-nos. Na nossa frente o espaço cénico apresenta-se como se fosse uma continuidade da plateia. O espectador sente que está numa sala, de uma qualquer casa, de um qualquer país, de um qualquer lugar onde, as vivências humanas e comunitárias nascem dentro de quatro paredes, em silêncios, em conversas. A casa é o centro da urbanidade do tempo que somos e onde fazemos cidade.
O espectador parece que foi convidado para, ali, ser um observador, ou porque não um juiz, sim, talvez até um Voyeur , que está ali, a invadir a privacidade, escutando aquelas conversas entre personagens que falam de intimidades, de vivências psicológicas, de amor e ódio, de lágrimas, de paixões, de sexo, fofoquices e canalhices, amizades e traições, em suma são as relações humanas que, vão emergindo naqueles diálogos e confrontos entre personagens, na medida em que elas vão desnudando as próprias vidas.
As situações nascem ora com um sentido dramático, entre o viver e morrer, ou, entre o sentido cómico, de tão hilariantes e imbecis sentimos que são os actos humanos.
A peça coloca o espectador perante uma espécie de catarse e reflexão sobre os dias e as vidas vividas, porque, afinal, todos nós, vivemos, sabemos, ou conhecemos situações e contextos que estão espelhados no belo texto de Woody Allen.
O que acontece em palco, naquela sala é, de certa forma, um retrato da sociedade, uma sala que é o espelho da vida. Essa vida feita de “eus” que conhecemos e que se procuram a si mesmos, de “tus” que não se encontram porque vivem em busca do “eu” que não são, e, por fim, do “nós”, afinal, as ilusões são a fuga para nunca encontrar o que está dentro de nós, e nunca descobrimos, pela incapacidade de sabermos que o “eu” só se encontra a si, quando abraça o “tu”, e, é nessa descoberta que somos um “nós”.
Aquela sala é um Gabinete de uma Psicóloga, ou de um Psiquiatra. Os diálogos entre personagens desocultam as situações, entram dentro dos nervos, as neuroses, as psicoses, as depressões, o vazio, o sexo que não é amor, e o amor que não é sexo. A bebida como refúgio.
É por isso que aquela sala é também um bar, as garrafas e os copos misturam-se com as agressões verbais, uma bebedeira de sentimentos. Instintos. Emoções. Pensamentos. O Amor e a amizade.
Um jogo de diálogos maravilhosamente interpretados, com energia, porque nesta peça o texto é âncora de tudo o que acontece no palco.
As Elsas são centrais, são as personagens por onde tudo circula e diga-se, ambas, assumem os seus papeis de forma plena e com vivacidade. Um aplauso. Esta peça é o texto e as interpretações, e, pode dizer-se que todos, no palco, agarraram os personagens e deram-lhes a energia necessária para os sentirmos vivos em cena, tal como se fora o mundo real.
Esta peça carece que os actores e actrizes encarnem as personagens com intensidade, e, neste caso que vivam e sintam as palavras, cada palavra tem que nascer a fluir nos gestos, no rosto, na dicção, na beleza que se coloca na interpretação, porque o texto tem um peso central e só ganha vida pelas interpretações. E, pode dizer-se que nesta peça as palavras transformam-se em acção. Estão de parabéns.
A Elsa Coelho merece um registo, porque vive uma personagem catalisadora, assume uma posição estruturante que, na verdade, ela vive com energia, intensidade, gestualidade e numa dicção que dá vida à personagem.
A encenação de Abílio Apolinário, tem o seu cunho, a marca da simplicidade, de dar espaço para as cenas e contracenas fluírem. Uma encenação naturalista, com rigor de pormenores que permitem dinâmica nos movimentos e criar um espaço cénico que envolve aos personagens, deixa-os viver, respirar, e, simultaneamente, coloca o espectador como um observador.
O público é um personagem ausente e presente dentro da sala, essa sala que é a vida, a cidade.
Essa sala que se apresenta como uma montra da vida real.
Esta peça permite rir, pensar, tem todos os ingredientes para pensar a vida e o tempo que vivemos, está lá talvez, o que já escutamos e ouvimos – os divórcios, as infidelidades, as paixões, as amizades, o amor, o ódio. O pensamento emocional. O pensamento racional. O sexo. O instinto. Está lá Freud e até Pavlov.
Talvez no final da peça o que fique seja esse desafio de cada um encontrar o “eu”, o “tu” e “nós”, que todos somos, sendo essa inexistência a ausência que conduz à ilusão às ilusões. Vale a pena ver esta peça.
Diverti-me. Ri a bom rir. Também pensei e senti contextos e situações, tantas que conheço. Coisas que se vivem.
Ver esta peça é como estar a observar dentro de um Laboratório de Análise Psico -Social, e, observando sentimos que a Psicologia se cruza com a Sociologia, abraça a Antropologia e, por fim, apela a que nos deitemos no sofá da Filosofia, o lugar, onde está o ponto de encontro dessa universalidade e cosmicidade, onde nasce o eu-tu-nós.
Como eu dizia a uma amiga, um destes dias, essa é a força que está lá no fundo, dentro de cada um, essa é a energia dos neurónios.
António Sousa Pereira
Ficha Técnica
INFIDELIDADES
Texto - Infidelidades de Woody Allen
Encenação, Abílio Apolinário
Interpretação
– Luís Soeiro ( João)
- Elsa Coelho ( Inês)
- Diana Neves ( Julieta)
- Elsa Barata ( Leonor)
- Luciano Barata ( Edu)
Assistência Técnica – Maria João Quaresma
44ª produção do Teatro Projéctor – Companhia de Teatro do Barreiro
Auditório do Teatro Projéctor
Rua Prof Joaquim Vicente França, nº 103
Barreiro
A peça «Infidelidades» de Woody Allen com encenação de Abílio Apolinário, vai arrancar numa primeira temporada com apenas seis espetáculos.
Em Setembro
Dias 29 e 30 - às 21h30
Em Outubro
Dia 13,14, 21 e 28, às 21h30.
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30.09.2023 - 18:21
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