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Pela destruição da calçada portuguesa na frente ribeirinha do Barreiro
Associação Calçada Portuguesa manifesta apreensão, indignação e revolta
"É totalmente injustificado e lesivo esse atentado contra a marca identitária nacional que representa os pavimentos artísticos em calçada portuguesa", afirma em resposta a Associação da Calçada Portuguesa.
Associação Calçada Portuguesa
Denúncia de destruição de calçada na cidade do Barreiro
Exmos Senhores,
Venho por este meio enviar a V. Exas. uma denúncia do que considero ser uma destruição de património, de calçada portuguesa, sem qualquer justificação, na cidade do Barreiro, numa das principais e emblemáticas avenidas da cidade, a Rua Miguel Pais.
Envio esta denúncia não no sentido de se evitar a obra, pois esta já está em fase de conclusão, mas para se evitar o mesmo atentado noutras artérias da cidade, uma vez que é intenção da autarquia fazê-lo.
Passo a expor o caso da Rua Miguel Pais, objeto da presente denúncia:
Esta avenida foi intervencionada há apenas 7 anos, no âmbito do programa REPARA, intervenção essa que veio assegurar uma continuidade até outras artérias envolventes como a Almirante Reis, a Av. Bento Gonçalves e o próprio Barreiro Velho, parte mais antiga desta cidade.
Com esta intervenção houve claramente uma estratégia de criar um circuito urbano, no centro da cidade, envolvendo-a com o rio através de passeios em calçada portuguesa para que toda a população dela pudesse fruir.
Felizmente o google maps ainda permite visualizar esta rua antes da presente intervenção, pois as imagens captadas datam de 2022. No link que envio e se fizerem todo o percurso da Rua, até à linha do comboio, é possível verificar que a calçada agora destruída, continha desenhos e símbolos da cidade, um continuum de passeios que davam prazer a quem neles caminhava.
Além da grave destruição de património que aqui está inerente, preocupa-me também os problemas de impermeabilização que esta importante artéria da cidade vai ter no futuro, pois o actual pavimento não possui as mesmas características de permeabilização que a calçada tinha, aliás muito pelo contrário, como poderão verificar nas imagens que anexo.
Segundo a autarquia esta intervenção foi realizada no âmbito do Programa Acessibilidades 360º -, uma das componentes do Programa de Intervenção nas Vias Públicas, todo ele coberto pelo PRR, e que atua para mitigar ou mesmo eliminar as barreiras que os territórios colocam, nomeadamente às pessoas com mobilidade condicionada no acesso e utilização do espaço público.
Não desvalorizando de nenhuma forma o âmbito deste programa, mas sei que haveriam muitas mais artérias da cidade a necessitar deste tipo de intervenção, onde se pudessem aplicar melhor estas verbas, e não numa rua, intervencionada há apenas 7 anos, e que não apresentava quaisquer constrangimentos à mobilidade dos seus cidadãos.
A autarquia invocou ainda que o tipo de calçada não era calçada portuguesa típica, mas pedra de vidraço, que segundo refere a autarquia é aconselhada substituir no âmbito da candidatura 360º e segundo o disposto no DL n.º 163/2006, onde constam as normas técnicas para a melhoria da acessibilidade das pessoas com mobilidade condicionada. Confesso que após estas declarações fui ver o dito decreto-lei e as normas e não encontrei a referida recomendação.
Independentemente de não ser calçada portuguesa típica, aliás o Vereador com o pelouro não apresentou qualquer documento que o comprovasse, toda aquela calçada agora destruída, atravessou vários mandatos e orientações políticas para a cidade, e constituía um património que a todos os Barreirenses pertencia.
Aproveito para vos dar também conhecimento de um artigo publicado no jornal local, Rostos, da autoria do seu próprio diretor, relativo a esta obra:
https://www.rostos.pt/inicio2.asp?cronica=1006464&mostra=2&seccao=inferencias&titulo=Inferencias-Barreiro-E-mais-facil
Importa acrescentar que esta suposta requalificação da Rua Miguel Pais, foi feita sem qualquer parecer, sem que a população fosse consultada e sem
perceber (publicamente) se outras possibilidades se configuravam como viáveis.
Considerando que a arte e “saber-fazer” da calçada portuguesa está, desde julho de 2021, inscrita no Inventário Nacional do Património Cultural Imaterial, gostaria de saber de que forma poderão dar seguimento a esta queixa e das diligências que vão entender tomar face à mesma.
Se por exemplo, vão questionar a autarquia do porquê desta destruição de património que a todos pertence, e que mais artérias da cidade com calçada portuguesa prevê a autarquia intervencionar no âmbito do referido programa.
Infelizmente esta exposição/queixa em nada muda o que já foi feito nesta importante artéria da cidade do Barreiro, mas entendo que poderá evitar futuras intervenções noutras ruas cuja calçada é património de todos os Barreirenses.
O meu obrigada desde já.
Melhores cumprimentos,
Susana Silva.
RESPOSTA da Associação da Calçada Portuguesa
Exma Senhora Susana Silva,
Muito agradecemos o seu contacto e a denúncia do que está a acontecer com a calçada portuguesa no Barreiro. Foi com grande apreensão, indignação e mesmo revolta que recebemos a notícia da destruição da calçada portuguesa na frente ribeirinha, junto à Rua Miguel Pais, no Barreiro, e, pior ainda, do perigo que correm outras calçadas portuguesas, com características decorativas, nesse município, como refere.
Em nossa opinião é totalmente injustificado e lesivo esse atentado contra a marca identitária nacional que representa os pavimentos artísticos em calçada portuguesa, que é a manifestação física de uma arte e de um saber-fazer que, por iniciativa da Associação da Calçada Portuguesa, integra o Inventário Nacional do Património Cultural Imaterial desde Julho de 2021. Um desrespeito para com os munícipes, que não foram consultados sobre a intenção de substituição do pavimento, e, mais ainda, para com os calceteiros que, sendo uma profissão artesanal em risco, veem o seu trabalho barbaramente destruído em nome de escolhas pouco ponderadas e que em nada dignificam o património cultural local.
Para mais, tratando-se da destruição de uma obra de beneficiação recente que converteu um território anteriormente muito degradado que, finalmente, havia sido restituído à população, convertido num espaço de lazer que marcava já o imaginário de moradores e visitantes. Escolhas que merecem ser questionadas porque é o erário municipal que assim é delapidado sem justificação. Este passeio frente ao rio muito ficou valorizado graças ao tipo de pavimento escolhido, com o padrão da calçada portuguesa a remeter para a ondulação do Tejo (e/ou para as suas gaivotas), do nosso Mar da Palha, que assim se espraiava terra dento, dando-lhe identidade própria.
Mais, para além de embelezar e de dotar de memória os espaços onde foi, e é, construída, a calçada portuguesa é o único pavimento ecológico e ambientalmente sustentável utilizado em Portugal.
Sugerimos que envie também a sua denúncia para a Património Cultural, IP (antiga DGPC, responsável pela inventariação do saber-fazer desse bem cultural), através do e-mail: geral@patrimoniocultural.gov.pt, ou de carta, para a seguinte morada: Património Cultural, IP - Palacete Vilar de Allen - Rua António Cardoso, nº 175 - 4150-081 Porto. Esta é a instituição oficial que tutela as classificações de património material e a inventariação do património imaterial.
Não imagina o quão grata a Associação da Calçada Portuguesa fica por haver cidadãos empenhados e conscientes, como a Susana Silva, em salvaguardar e proteger um património que sente, e muito bem, como seu, pois é de todos. Infelizmente, a única coisa que a Associação pode fazer relativamente à sua denúncia, que entendemos como plural, é contactarmos a Câmara Municipal do Barreiro e manifestarmos o nosso desagrado, alertando para o atentado e, pedagogicamente, tentar sensibilizar para a importância identitária desta manifestação artística.
Bem-haja.
Subscrevemo-nos, com consideração e os melhores cumprimentos,
Associação da Calçada Portuguesa
27.11.2024 - 14:14
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