colunistas
Nu, silêncio escrevo-te!
“o fim último da palavra é o silêncio”
Por Carlos Alberto Correia
Barreiro
Para as civilizações orientais o silêncio define-se como forma de respeito e sabedoria, um meio para alcançar a compreensão mais profunda da realidade. Já no Ocidente, pode o silêncio ser considerado como falta de interesse, desconforto ou desinteresse.
Deste modo, logo no título, o autor, em dupla provocação, escreve-se Nu e no recolhimento de alguém que, abandonando os ruídos quotidianos, se apresenta despido de preconceitos usando, de forma transparente, o silêncio como meio privilegiado de comunicação. Lembremo-nos que já, Saint-Exupèry, no “Principezinho”, dizia serem as palavras, por vezes, fontes de mal entendidos. Coloca-nos, deste modo na aparente contradição de usar, para comunicar, o silêncio. No entanto, e aqui o jogo filosófico poético deste livro, é com palavras que comunica os silêncios que as palavras contêm e com o qual transmite mais profundamente aquilo que o usos das palavras, só por si permite. Confuso? Pois, é que Sousa Pereira procura expressar pensamentos e sentimentos que só o complexo corpo/espírito pode, em sensações e afeições expressar, e que, ao traduzi-lo com palavras algo se perde, se transmuta, trai e desvia da essência das coisas. Estamos pois perante um livro de poemas e prosa poética que encarna a linguagem profunda da filosofia, ou perante uma filosofia do estar e do sentir que se expressa na linguagem poética. É assim a grande articulação deste pequeno livro.
Sabemos que o efeito poético resulta, muitas vezes, nos espaços do não dito, nas pausas e silêncios que se insinuam no campo entre as palavras. Por isso, quando nos diz “É pelo silêncio que vamos” convoca-nos, o autor, a penetrar na liberdade oferecida pelo ato silencioso de meditar, de parar de alguma forma o correr do tempo, para melhor aprofundar a substância das coisas que se expressam quando o ruído se esvai. Esta “ida pelo silêncio” traça um percurso que vai da experiencia sensorial à expressão artística.
Reforça esta ideia quando nos diz “o poema nasce nu” – tal como se escreve Nu – e, neste passo indicia a pureza da criação artística, o trânsito entre os “sons que emocionam o corpo” para “ o poema que nasce”, evidenciando a conexão profunda entre a experiência dos sentidos e a criação poética, no caminho da “Esperança”, palavra que emerge como o estado do Ser que emerge do silêncio.
Este silêncio, que não representa a falta de voz, aparece, pelo contrário, como forma de repressão do vazio, como fonte de libertação, como expressão sem manchas, nem sombras, do EU primordial. É no silêncio que o autor se encontra, libertado de amarras externas e, quase de forma mágica, descobre a essência da sua voz própria. Num mundo repleto de ruídos encontrar o silêncio é não só um ato de resistência, como uma jornada tendente à mais genuína emancipação criativa. Torna-se, deste modo, o silêncio o terreno propício à poesia, à descoberta de uma liberdade mais autêntica e profunda, porque o mesmo advém “do abismo dos nervos”, remetendo para a relação complexa entre o físico (o sistema nervoso) e a mais íntima profundidade da essência espiritual, local onde a beleza e fragilidade do ser do humano é construída.
Mas o autor também nos diz que o silêncio se faz “cascata de musicalidade”. Esta imagem sugere um fluxo contínuo e poderoso, uma harmonia interna, o ritmo que apenas se apercebe na quietude da mente ou do coração, construindo-se em inestimável fonte de autoconhecimento e paz interior. É neste silêncio que se encontra a verdade do que e quem somos e nos define enquanto seres humanos.
Por “ter opinião é pensar o que vivemos”, ou digo eu, o que lemos, tracei estas linhas motivado pelo desejo de comunicar o momento em que, pegando neste livro, o devorei de seguida, nascendo então o desejo de entrar em diálogo incorpóreo com o autor. As opiniões expressas derivam daquilo que das palavras que li, eu interpretei e fiz minhas. A ele caberá considerar o ato como lícito ou abusivo, mas como “quem constrói a casa na praça arrisca-se a que lhe atirem pedras” aqui vão as minhas pedradas, eivadas da noção de quanto disse não chegou a dizer o necessário, ou mesmo o mais importante. Por tal me penitencio e proponho, a quantos fizeram o favor de seguir estas linhas, que se munam do livro, editado pela KDP-AMAZON, e queiram fazer o favor de julgar a oportunidade das mesmas.
Ao Sousa Pereira expresso a minha gratidão pelo que expondo-se nos expôs e aguardo os anunciados dois volumes que completarão este ciclo.
Carlos Alberto Correia
13.07.2024 - 19:03
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